5 livros legais de escritores latino-americanos

Muita gente acha que ser um bom leitor significa ler muitos, muitos, muitos livros. E só. Houve um tempo em que eu pensava assim e prezava mais pela quantidade do que por qualquer outra coisa.

Hoje penso de maneira diferente. A leitura é meu hobby e também a forma como eu aprendo mais sobre o mundo. Gosto de me desafiar e de disputar contra eu mesma em relação aos gêneros, estilos, autores, nível de dificuldade e, sim, até à quantidade de livros que leio de um ano para o outro.

Mas acho que o verdadeiro segredo para ser um bom leitor reside na diversidade de leitura.

Ler só livros de escritores homens ou só de autores de um determinado país pode ter seu mérito, mas não é exatamente diversidade, é?

Por mais que seja legal ter um autor favorito e ler todas as obras dele, acho interessante a ideia de sair da zona de conforto e de ler de tudo um pouco, mesmo. 

Para te ajudar a diversificar seu “cardápio” de leituras, elaborei uma lista com meus livros favoritos de escritores latino-americanos! Nossos hermanos têm obras excelentes e, muitas vezes, a gente acaba focando em dois ou três escritores e esquece que existem muitos outros que também são maravilhosos!

5 livros legais de escritores latino-americanos

Vamos aos títulos?

  • La Tregua e A Borra do Café, de Mario Benedetti

A trégua de mario benedetti

“La Tregua” foi o livro que fez eu quebrar meu jejum de não comprar livros, lá no começo do ano, quando fui para o Uruguai. Comecei a ler ele enquanto tomava sol na praia de Pocitos e acabei ficando mais morena nas costas do que na parte da frente do corpo. Não me arrependo nem um pouco.

O livro conta a história de Martín Santomé, um viúvo que está contando os dias até sua tão aguardada aposentadoria. Para marcar o feito, ele começa um diário onde relata alguns dos acontecimentos terrivelmente rotineiros de seu trabalho em um escritório, como contador. Os seus 3 filhos, já adultos, criados e maduros, também aparecem nos escritos.

Tudo vai bem rotineiro e calmo na vida de Martín. Até que uma funcionária nova, Laura Avellaneda, começa a trabalhar no escritório. Laura vira o mundo de Martín de ponta cabeça e a tão rotineira rotina dele vai para as cucuias. Os dois se apaixonam e engatam uma relação tão linda e preciosa, que você meio que se apaixona junto.

frases de la tregua mario benedetti

Eu li “La Tregua” em espanhol e  por ter tantas gírias e expressões tipicamente uruguaias me lembrou TANTO do meu vô, que eu quase não aguentei de saudades.

“La Tregua” é um livro doce, mas tão, tão, tão triste que eu fico chateada só de lembrar. Eu chorei horrores. É claro que vou reler no futuro – e em português, de preferência.

A história se passa em Montevidéu e as descrições são super vívidas, especialmente as dos cafés. A história foi publicada em 1959 e a impressão que temos é de que pouca coisa mudou na cidade, desde então.

Alguns dos pontos turísticos mencionados na história aparecem no Guia Benedetti, publicado pela Fundação Mario Benedetti. Quando terminei o livro, eu já estava em casa, mas a vontade foi voltar para o Uruguai, fazer o percurso do guia e ver Montevidéu pelos olhos do Martin.

capa de a borra de café de mario benedetti

“A Borra do Café”, eu li em português mesmo e me diverti bastante lendo. É a história de Claudio, começando por sua infância até ficar mais velho e adulto.

A infância de Claudio é marcada pelo futebol, pelas mudanças da família, a morte da mãe e pelo assassinato de um morador de rua em seu bairro. Há uma grande leveza na forma como ele narra esses acontecimentos.

“A Borra do Café” é parcialmente baseado nas memórias de infância do próprio Benedetti e acho que isso, de certa forma, me ajudou a gostar ainda mais do livro!

Minha impressão é de que em “A Borra do Café”, a cidade de Montevidéu aparece mais do que em “La Tregua”. Agora que conheço o lugar, quero reler o livro para verificar isso.

capa da nova edição de o carteiro e o poeta de antonio skármeta

Eu já resenhei “O Carteiro e o Poeta” aqui no blog e você pode ler a resenha para mais detalhes. Basicamente, o livro conta a história da inusitada amizade entre o poeta Pablo Neruda e seu carteiro.

Antonio Skarmeta é chileno e, recentemente, a Editora Record reeditou “O Carteiro e o Poeta”, que estava fora das prensas (o meu exemplar foi comprado em sebo, mas mesmo assim quero uma edição nova).

O livro virou filme em 1994 e eu escrevi sobre ele no blog também!

“Como Água para Chocolate” é um livro da escritora mexicana Laura Esquivel.

O livro conta a história de Tita, que nasceu em uma cozinha e cuja mãe não queria que se casasse. A tradição da família pregava que, por ser a filha mais nova, ela não poderia se casar e teria que ficar cuidando da mãe até ela morrer.

capa do livro como agua para chocolate da laura esquivel

Quando cresceu, Tita se apaixonou perdidamente por Pedro, sem poder ficar com ele por conta da bendita tradição. Para resolver todos os problemas (só que não, né?) Pedro acaba se casando com a irmã mais velha de Tita, só para poder ficar perto de sua amada.

Sem poder conversar ou trocar olhares por conta de uma proibição da irmã, Pedro e Tita se comunicam por meio da culinária e das sensações que a comida de Tita induz em todos os membros da família. As descrições alimentares são riquíssimas e a dose de realismo fantástico típica dos escritores latino-americanos também temperam o livro.

A resenha completa pode ser lida aqui no blog, neste link.

elenco de como água para chocolate
Tita e Pedro em uma das cenas de “Como água para Chocolate”

Capa de The Brief Wondrous Life of Oscar Wao

Apesar de estar em inglês, “The Brief Wondrous Life of Oscar Wao, é um livro de um escritor latino-americano. Junot Diaz nasceu na República Dominicana e emigrou para os EUA aos 6 anos de idade.

O livro conta a história de vida de Oscar Wao, mas vai além disso ao mostrar todas as gerações de mulheres fortes anteriores (e uma contemporânea) a ele.  O livro também se aprofunda e dá um grande panorama sobre como a ditadura de Trujillo afetou a vida de todos na República Dominicana.

É fascinante e, com certeza, uma das melhores leituras desse ano – até agora! Não é à toa que Junot ganhou um Pulitzer por esse livro, né?

Espero que minha lista te ajude a diversificar mais suas leituras! Sei que existem muitos outros escritores latino-americanos ótimos e alguns dos que li (Isabel Allende com “A Casa dos Espíritos” e Mario Vargas Llosa com “Travessuras de Menina Má”) não apareceram nessa lista.

Se gostarem do post, eu posso até fazer uma continuação!

Beeijos, A Garota do Casaco Roxo

PS: Recentemente escrevi uma resenha de um livro de mistério, com um narrador super não-confiável! Meu texto sobre “Sempre Viveremos no Castelo”, de Shirley Jackson, pode ser lido na Revista Pólen.

Visita à Fundação Mario Benedetti, em Montevidéu

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No começo de fevereiro eu tive a oportunidade de visitar o Uruguai pela primeira vez. Minha família é uruguaia e eu cresci com todo um imaginário das ruas, pessoas e dialetos locais e agora, finalmente, consegui colorir e dar vida a todas as imagens mentais que criei durante minha vida. Tudo graças a um casal de amigos! ❤

A verdade é que muitas das ideias que eu tinha sobre o local foram derrubadas e outras foram assentadas. Entre mates, chivitos, choripans e biscochos, o mais impressionante foi caminhar pelas ruas e pelo bairros de Montevidéu como se eu conhecesse tudo muito bem, como a palma da minha mão e talvez até melhor que São Paulo. Eu sabia quais ônibus pegar, que rua descer e para que lado caminhar sem nem precisar olhar para os mapas.

Talvez, essa impressão tenha sido causada pela leitura de livros do escritor uruguaio Mario Benedetti (tem a influência da minha família também, mas vocês me entendem). “Primavera Num Espelho Partido”, “A Borra de Café” e, mais recentemente, “A Trégua” foram alguns livros que li do autor e que me deixaram com a permanente sensação de familiaridade, de já ter lido aquelas histórias e de, talvez, já ter caminhado por aquelas ruas sem nem ter ido para lá. Com “A Trégua”, que eu li em espanhol, a sensação foi mais intensa. A linguagem montevideana, os sotaques e as escolhas de palavras me passaram a sensação de estar escutando uma história lida pelo meu avô.

Eu não criei um roteiro específico para visitar Montevidéu, mas tinha comigo uma lista de lugares que queria conhecer. Um deles era a Fundação Mario Benedetti, que fica na Calle Joáquin de Salteráin, 1293, no bairro de Cordón, em uma região majoritariamente residencial (eu super achei que tinha me perdido no caminho, porque só encontrei casas, um mercadinho e uma borracharia).

Um show à parte, a sede da Fundação é uma casa de 1910, que foi reformada e restaurada recentemente para sediar o local. Antes disso, o acervo de Benedetti ficava em uma Associação de Escritores Uruguaios.

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Fui recebida no local por Hortensia, a secretária do local e a pessoa responsável por fazer os tours da casa. Ela me contou que a fundação era um projeto de vida de Benedetti, que só pode realizá-lo depois de morto. Ele acreditava que criar a fundação com seu nome, quando ainda estava vivo era ser um grande puxa-saco de si mesmo.

Em seu testamento, Benedetti deixou tudo planejado: as ações da fundação, os presidentes, vice-presidentes e até suplentes, caso os primeiros selecionados morressem e ele também escolheu o local da sede: O apartamento onde ele e Luz, sua esposa, passaram boa parte de suas vidas, depois do exílio na Espanha.

Por ser um prédio residencial, os vizinhos não gostaram da ideia de ter gente entrando e saindo para visitar o local. Então, como alternativa, os diretores da fundação apontados por Benedetti escolheram a casa e a compraram e reformaram com o dinheiro da venda dos apartamentos de Montevidéu e da Espanha, que Benedetti tinha comprado durante o exílio.

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Quando cheguei, não havia ninguém além de Hortensia na casa. Ela me contou que poucas pessoas, uruguaios inclusive, sabem da existência da Fundação, que além de preservar o trabalho de Benedetti, também organiza um concurso literário bienal e também trabalha para a preservação dos direitos humanos.

Todos os móveis usados no local, as cadeiras, mesas, lustres e até as xícaras e pratos eram de Benedetti e Luz. Em uma das salas há um armário lindo com todas as coisas de cozinha do casal. A foto que eu tirei de lá ficou ruim, por conta da luz fraca, mas é possível ver um pedacinho dele aqui:

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Há uma réplica do escritório de Benedetti, feita à partir dos relatos dos amigos e colegas do escritor. Ela é tão bem feita que dá a impressão de que ele saiu para ir na panaderia comprar biscochos e logo estará de volta. É possível ver um caderno com suas anotações, sua boina e seus suspensórios pendurados ao lado da porta. 

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Ao fundo, há um jogo de xícaras e um bule de café, pronto para ser usado. Hortensia me contou que, certa vez, Luz disse a Benedetti que a única função dele na casa era fazer o café e, por isso, as xícaras ficavam sempre em seu escritório. Em uma das estantes, há uma coleção das edições estrangeiras de seus livros. O local fica fechado porque Hortensia me contou que era comum que as pessoas tocassem e até tentassem roubar algumas coisas.

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A biblioteca com o acervo de livros pessoal de Benedetti também está lá e Hortensia conta que, em breve, esses livros vão ser disponibilizados ao público. Um dos objetivos da Fundação é que o local de sua sede funcione como um espaço cultual que possa ser desfrutado pelo público e por estudantes, para a realização de oficinas e cursos.

A impressão que tive é que a fundação ainda está se organizando e seu trabalho não está totalmente finalizado ainda, da forma como Benedetti queria.

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Depois da visita à casa, Hortensia me deu um folheto, o “Guia Benedetti”, uma ideia genial que te ajuda a conhecer Montevidéu a pé. Como boa parte dos livros de Benedetti tem referências a lugares e ruas de Montevidéu, o Guia Benedetti seleciona esses trechos específicos e cria rotas que você pode seguir, junto com os trechos em que Benedetti os mencionou e a que livro pertencem. Maravilhoso!

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A única coisa chata é o horário de funcionamento. No site, somos informados de que a Fundação fica aberta até às 18 horas. Fui uma segunda vez para o local, desta vez acompanhada da minha tia e chegamos lá às 17h21. Mesmo assim, Hortensia informou que não poderia realizar o tour, por conta do horário. Uma pena. 😦

Além da fundação, eu visitei um monte de livrarias e até um café super especial e simbólico em Montevidéu, mas isso fica para outro post! Fique de olho!

Beeijos, A Garota do Casaco Roxo